A fase do desenvolvimento motor compreendida como a fase dos movimentos fundamentais representa o tempo – 2 aos 7 anos – em que as crianças mais novas estão ativamente envolvidas na exploração e experimentação do potencial de movimento de seus corpos é o tempo de descoberta do modo de executar uma série de movimentos de estabilidade e equilíbrio (caminhar sobre o cordão da calçada ou equilibrar-se em um pé), de locomoção (correr e pular) e manipulação (arremessar e pegar). Essas habilidades como podemos perceber têm utilidade durante toda vida, pois são componentes importantes da vida diária de adultos e também de crianças.
Um grande erro que por vezes nos deparamos é pensar que o desenvolvimento de tais habilidades destes movimentos fundamentais para toda vida são determinados exclusivamente pelo processo de maturação o que não é verdade. Embora a maturação desempenhe determinado papel no desenvolvimento destes padrões, não pode de modo algum ser visto como a única influência. As condições do ambiente e as oportunidades de prática bem como o incentivo, a instrução e o contexto em que tudo isso ocorre são também fatores e por sua vez determinantes no grau de desenvolvimento dessas habilidades. Na realidade o que ocorre maioritariamente com o processo de maturação é que por sua vez muitas crianças acabam por não alcançar níveis de proficientes nessas habilidades e não apresentam a competência motora necessária para à aplicação na prática.
Podemos entender as habilidades motoras fundamentais como as letras de um alfabeto, essas fornecem a base para o aprendizado das palavras (habilidades motoras combinadas) que depois permitirão às crianças a produção de sentenças e parágrafos (habilidades desportivas e sequências de dança específicas) por meio da reestruturação das letras em várias combinações. Se os princípios básicos das letras não forem assimilados, as crianças terão um desenvolvimento linguístico deficiente. De modo similar no desenvolvimento motor, a capacidade de movimentar-se com facilidade, com diversas combinações ficará comprometida quando a criança não adquire a competência motora básica durante os primeiros anos.
Portanto, a criança que tiver mais acesso a atividades físicas terá mais oportunidades de desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais enquanto outra, com oportunidades limitadas, terá uma competência mais baixa. No entanto, nesse momento do desenvolvimento, a relação entre atividade física e competência motora é fraca e, mais provavelmente, ainda não tem efeitos negativos. Porém, quando a criança passa em meados da infância e da adolescência, a relação entre atividade física e competência nas habilidades torna-se mais significativa e fica fortalecida.
Níveis mais elevados de habilidades motoras oferecem maior repertório de movimentos e mais possibilidades de engajamento em várias atividades físicas. As crianças com maior habilidade costumam escolher para si próprias, níveis mais elevados de atividades físicas. Estas também têm maior probabilidade de considerarem-se competentes e de obter prazer intrínseco na participação em desportos e jogos. Essas interações funcionam como um espiral positivo, pois estas crianças se mantêm engajadas no desporto e tendem a se tornar cada vez mais competentes. Mas o que acontece com as crianças menos competentes? Por meados da infância, as que são menos competentes em habilidades provavelmente vão preferir ficar fora da atividade quando há possibilidade de escolher ou então vão se engajar em níveis mais baixos, caso sejam obrigadas a fazê-la como acontece em uma aula de Educação Física. Portanto, a competência motora baixa vai levar a baixos níveis de atividade física, o que vai minimizar as oportunidades de aumentar essas competências. Para complicar ainda mais este efeito, em determinada altura as crianças já possuem potencial cognitivo para avaliar com precisão a própria competência motora se é “boa” ou “ruim” em comparação com a de seus colegas, e essa compreensão junto com várias experiências de fracasso, produzirá perceções baixas de competência motora e essas interações funcionarão como um espiral negativo de desengajamento do desporto. Ou seja, criança que tem uma competência motora limitada acredita que “não serve para o desporto” e, portanto, prefere atividades sedentárias em vez da atividade física. À medida que passam de meados da infância à adolescência, cria-se uma divisão cada vez maior entre aquelas ativas com competência motora, que gostam de atividade física, e aquelas inativas e com menor competência motora, que evitam essa atividade. Como podemos ver o desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais no início da infância é central para a promoção de um estilo de vida ativo fisicamente ao longo de toda a infância e na adolescência.
Referência
David L. Gallahue, John C. Ozmun, Jacqueline D. Goodway. Compreendendo o Desenvolvimento Motor : bebês, crianças, adolecentes e adultos. 7. ed. – AMGH Editora, 2013
JUL